• A carne nossa de cada dia

     

    Falar em vegetarianismo é quase um insulto para muitos gaúchos, ainda mais no mês em que se comemora a Revolução Farroupilha. A opção por banir a carne da dieta costuma levantar debates acalorados entre defensores e detratores, pelas mais diversas razões – saúde, proteção aos animais e até crenças religiosas estão na pauta das discussões. Mas o que nos interessa aqui é a questão da alimentação saudável. Afinal, não comer carne faz bem? Comer carne faz mal?

    Não existem dados precisos sobre o número de vegetarianos no Brasil, mas segundo uma pesquisa sobre hábitos alimentares realizada pelo grupo Ipsos, 28% das pessoas “têm procurado comer menos carne”. Além disso, a Sociedade Vegetariana Brasileira vem observando um aumento na quantidade de restaurantes e produtos voltados especialmente a adeptos e simpatizantes. O interesse pelo assunto cresce principalmente à medida que a carne é cada vez mais associada à obesidade e a problemas sérios de saúde.

    Apesar dessa tendência, ao menos no Rio Grande do Sul a tradição ainda fala mais alto. Segundo o Sindicato da Indústria de Carnes, o estado é campeão em consumo de carne no Brasil – cada gaúcho ingere 45 kg por ano, contra uma média de 36 kg no restante do país. O hábito do churrasco e a presença da carne em quase todas as refeições estão entre as causas do resultado de outro ranking liderado pelo estado: de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 63% da população gaúcha está acima do peso.

    No entanto, de modo geral o consumo de carne não é condenado pelos especialistas. A ideia que parece estar mais consolidada é a de que comer moderadamente não é prejudicial à saúde. Alimento de reconhecido valor nutritivo, fonte de proteína, ferro e vitaminas, a carne ocupa posição de destaque na pirâmide alimentar e não é facilmente substituída – esse, aliás, é um dos maiores desafios dos vegetarianos, que precisam redobrar a atenção se quiserem evitar doenças como a anemia e problemas como palidez, fraqueza e perda de peso.

    No caso dos gaúchos, o problema parece ser o tipo e a quantidade de carne ingerida. Recentemente, o Instituto de Cardiologia do RS divulgou um estudo em que comprovou que a carne vermelha não altera os níveis de colesterol e a pressão arterial. Porém, isso só vale para a carne magra (aquela da qual se retira a gordura visível), e exclui completamente o consumo de embutidos, salsichas, linguiças e mortadela. Nosso tradicional churrasco, portanto, combina vários elementos considerados “perigosos”, como os cortes gordos e o tão apreciado salsichão.

    Já a pesquisa feita pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, trouxe resultados menos otimistas em relação ao consumo da carne vermelha. O estudo, que acompanhou 120 mil pessoas durante quase 30 anos, revelou que a ingestão de uma porção diária de 85 gramas de carne processada – salsicha ou bacon, por exemplo – eleva em 20% o risco de morte e de desenvolver doenças do coração, câncer e diabetes; se a carne não for processada, como um bife, o aumento é de 13%. A pesquisa defende a substituição da carne vermelha por outras fontes de proteínas, como grãos integrais, peixe e frango.

    Mais uma vez, a moderação parece ser a palavra-chave para quem quer manter uma alimentação saudável e balanceada. Consumir carne – ou qualquer outro alimento – em exagero nunca será um hábito inteligente, ao passo que uma decisão extrema como a de cortar a carne do cardápio precisa ser tomada com cuidado, responsabilidade e, sobretudo, colocando a saúde acima de qualquer ideologia.